quinta-feira, 13 de novembro de 2008

VIDA E OBRA DE ZECA AFONSO TEMA DE DEBATE EM MADRID

Os 20 an0s da morte de Zeca Afonso serviram, anteontem à noite, de pano de fundo para um debate em Madrid sobre o papel da música nas transições para a democracia em Portugal e Espanha.


O debate foi protagonizado, entre outros, pelos músicos Luís Pastor e Júlio Pereira. Pastor, o músico espanhol que mais cantou Zeca Afonso e que também se tornou famoso pela sua obra política e de intervenção, recordou que a maioria dos músicos e do público espanhóis desconheceu, durante muitos anos, a obra do artista português. "Havia muitos músicos e artistas espanhóis que não conhecia Zeca Afonso e a sua obra. Na altura França ou América Latina eram maiores influências. Mas quem ouvia pela primeira vez, a lírica, a música, enamorava-se", recordou. "Acabou por ter um impacto tremendo tanto entre músicos espanhóis como entre o público. E acabou por ser a porta de entrada para se conhecer outras vozes portuguesas da altura", disse.
Julio Pereira, que produziu os ultimos três albuns de Zeca Afonso, disse que o mais estranho foi ver o músico " intelectualmente bem para trabalhar, mas sem voz e com o corpo a desaparecer". "Foi uma doença muito estranha. De um homem que foi muito mais do que um músico, que conhecia e queria saber do mundo, que era genuinamente humano. Que gostava mais das pessoas do que da música", disse.

In "Jornal de Notícias"
12/11/2008

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

A Morte Saiu à Rua - alla Bartók

Arranjo de "A Morte Saiu à Rua" de José Afonso

Instrumentação:
  • Voz;
  • Clarinete em si bemol;
  • Tamborim;
  • Ferrinhos;
  • Clavas;
  • Xilofone;
  • Violoncelo.
A parte do clarinete será assegurada pela Maria Goreti Calvão e a de violoncelo por mim. Solicito aos colegas interessados em participar que o manifestem. 

Instrumentos musicais para a aula

Olá amigos:
na próxima aula, sexta-feira, gostava que vocês se fizessem acompanhar dos vossos instrumentos musicais para tentar-mos dar forma às nossas músicas. Obrigado e até amanhã.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

José Afonso

1- Breve Biografia


José Manuel Cerqueira Afonso dos Santos nasceu a 2 de Agosto de 1929, na cidade de Aveiro, numa casa situada na Fonte das Sete Bicas, onde viveu até aos três anos. Filho de José Nepomuceno Afonso, magistrado, e de Maria das Dores, professora primária, permaneceu em Aveiro por razões de saúde, confiado aos cuidados da tia Gigé e do tio Xico – um «republicano anticlerical, anti-sidonista. Um homem impoluto» (Salvador, 1999, p. 25) – quando seu pai foi colocado em Angola, em 1930, como delegado do Procurador da República em Silva Porto, tinha então um ano e meio. Cresceu no seio familiar das primas e dos tios rodeado de ternura fraterna. Sua infância reparte-se por Aveiro, Angola Moçambique, Belmonte e Coimbra.
Em 1932, por insistência da mãe, José Afonso parte no vapor Mouzinho, precisamente, para Angola, apenas com três anos e meio, acompanhado por um tio advogado em lua-de-mel. Aqui vive com os pais durante três anos onde inicia a sua instrução primária e se deslumbra com a imensidão africana. A relação física com a natureza causou-lhe uma profunda ligação ao continente africano que se reflectirá pela sua vida fora e obra.
Em 1936 regressa a Aveiro ficando a viver com umas tias do lado da mãe. Em 1937 parte para Moçambique, mais concretamente para Lourenço Marques, onde se reencontra com os pais e irmãos: João e Mariazinha, com quem viverá pela última vez em conjunto até 1938.
De regresso ao continente, em 1938, José Afonso foi para casa do tio Filomeno, presidente da Câmara Municipal de Belmonte e aqui concluiu a quarta classe. Num ambiente profundamente salazarista - seu tio era salazarista convicto - José Afonso vive um momento difícil: «Foi o ano mais desgraçado da minha vida», chegando, inclusivamente, a envergar a farda da Mocidade Portuguesa por imposição. No ano seguinte, 1939, os pais já estavam em Timor, onde seriam cativos dos ocupantes japoneses durante três anos, até 1945. Foram três anos sem quaisquer notícias dos pais.

1.2- O Período de Coimbra

José Afonso chega a Coimbra em 1940 para prosseguir os estudos. Matricula-se no Liceu D. João III e aqui conheceu António Portugal e Luiz Goes. Fica instalado em casa de sua tia Avrilete.
Começa a cantar em 1945 por volta do 5º Ano do Liceu e rapidamente é conhecido como um «bicho» que canta bem. A cidade exerce sobre si um grande fascínio. Assim, passa pelas Repúblicas e contacta com a vida boémia, os clubes recreativos – joga futebol na Académica –, e conhece «gajos populares», entre os quais, Flávio Rodrigues, que admira como exímio tocador de Guitarra. Neste contexto, inicia-se nas serenatas e em «festarolas de aldeia. Um sujeito qualquer queria convidar uns tantos estudantes de Coimbra, enchia-lhes a barriga e a malta cantava…» (José Afonso, citado por Salvador, 1999, p. 27).
Em 1948 completa o curso dos liceus e, em 1949, inscreve-se no 1º ano do curso de Ciências Histórico-Filosóficas da Faculdade de Letras. Integra-se no Orfeão e Tuna Académica e faz digressões pelo Continente, Angola e Moçambique. O reportório incide sobre o fado de Coimbra lírico e tradicional que interpretava de forma superior. É o tempo das tardes e noites de glória coimbrãs, da praxe académica, e, simultaneamente, dos primeiros contactos com os meios sociais desfavorecidos, miseráveis, das desigualdades sociais, como o Bairro do Barredo no Porto, que seria a fonte de inspiração para a sua balada «Menino do Bairro Negro».

1.3- O Primeiro Casamento

Por volta dos dezassete anos, José Afonso, conhece Maria Amália de Oliveira, uma humilde costureira, por quem se apaixona e viria a casar em 1950 em segredo, por oposição dos pais. Do casamento nascem dois filhos José Manuel, 1953, e Helena, 1954. Com o nascimento do primeiro filho, surgem grandes dificuldades económicas e, neste contexto, José Afonso, vê-se obrigado a dar explicações e a trabalhar como revisor no Diário de Coimbra, no sentido de colmatar a conjuntura económica.
A sua permanência em Coimbra desdobra-se nas seguintes fases: a vivência em casa da tia Avrilete, com o irmão João e as primas; a boémia e a praxe coimbrãs que se afastará mais tarde; o casamento com Amália; e a descoberta do fado de Coimbra como seu interprete renovador.

1.4- O Serviço Militar Obrigatório

O período compreendido entre 1953 – 1955 é passado em Mafra a cumprir o serviço militar obrigatório. «A espingarda que me foi confiada e que tenho de tratar como se tratam os cavalos de corrida é um mistério intrincado para mim, com culatra, cursores, percutores, cavilhas de segurança e o diabo a sete» (José Afonso, citado por Salvador, 1999, p. 29). Foi mobilizado para Macau, mas, por motivos de saúde, livrou-se. É colocado, posteriormente, num quartel em Coimbra.
Este período é bastante difícil em termos económicos e a crise conjugal bastante sentida, tal como refere em carta enviada aos pais em Moçambique.
Depois do serviço militar cumprido e já com dois filhos, concluiu em 1963 o curso da Faculdade de Letras de Coimbra com 11 valores com uma tese sobre Jean-Paul Sartre: «Implicações substancialistas na filosofia sartriana».
A sua experiência de professor do ensino secundário iniciou-se em 1955/56 num colégio privado em Mangualde; prolonga-se em 56/57 em Aljustrel e Lagos e em 1958 lecciona em Faro, passando ainda por Alcobaça.
O processo de separação, iniciado em 1956, e posterior divórcio: 1 de Julho de 1963, é inevitável e sobre esta experiência conjugal, José Afonso, manterá sempre um grande silêncio. As dificuldades económicas persistem e em 1958 envia os seus dois filhos para Moçambique, para junto dos avós.

1.5- A Crise Estudantil

A campanha eleitoral de Humberto Delgado, 1958, impressiona-o bastante. Este ano é um marco com que se inicia uma nova fase da sua vida, até 1962. Faz uma digressão de um mês por Angola com a Tuna Académica e é o vocalista do Conjunto Ligeiro que conta com José Niza. Em 1959, começa a frequentar colectividades e a cantar com regularidade nos meios populares.
Entre 1961-1962 segue com atenção a crise estudantil deste último ano. Convive em Faro com Luiza Neto Jorge, António Barahona, António Ramos Rosa, Pité e namora com aquela que será a sua segunda mulher: Zélia, natural da Fuzeta. Em 1964 regressa a África: Lourenço Marques, como professor, acompanhado por Zélia, onde reencontra os seus dois filhos. Esta experiência revelou-se fundamental na sua formação política desenvolvendo uma actividade anticolonialista que lhe trará problemas com a polícia política pela qual, mais tarde, será detido várias vezes.
Nos anos de 1965-67, José Afonso, dá aulas na Beira. Aqui, musicou a peça «A Excepção e a Regra» de Brecht. É precisamente em Moçambique que nasce a sua filha Joana, 1965.
Em 1967 regressa a Portugal, Lisboa, cansado do sistema colonial. Deixa seu filho mais velho, José Manuel, com os avós em Moçambique. É colocado como professor em Setúbal. Por motivos de saúde é internado durante 20 dias na Casa de Saúde de Belas, quando saiu da clínica tinha sido expulso do ensino oficial. Ao expulsá-lo da escola pública a polícia política (PIDE) reconduzia-o às cantigas que ele pretendera abandonar quando regressara de Moçambique. As explicações e actividade de cantor foram adoptadas como meio de subsistência.

1.6- Enquanto Há Força


Uma vez expulso do ensino oficial -seria reintegrado apenas em 1983 – José Afonso, dedica-se a cantar com mais frequência nas colectividades da Margem Sul que solicitavam a sua intervenção. As cantigas assumem uma forma de vida e, neste contexto, José Afonso, constrói toda a sua obra marcada por todo um percurso ligado, desde Coimbra, à guerra colonial, à ditadura salazarista e à sua própria luta. É perseguido pela PIDE, é preso várias vezes, vê sua obra censurada… resiste «enquanto há força». Morreu no dia 23 de Fevereiro de 1987, no Hospital de Setúbal, vítima de doença incurável. O funeral realizou-se no dia seguinte com mais de 30 mil pessoas a prestarem-lhe a última homenagem percorrendo os 1300 metros do cortejo fúnebre entre a Escola Secundária de S. Julião, até ao seu último refúgio: o cemitério da Senhora da Piedade, em Setúbal, onde os seus restos mortais foram depositados na sepultura 1606 do quadro 19.




Retirado de: Pacheco, A. (2006). Do Choupal até à Lapa: O Elemento Popular na Música de José Afonso. Trabalho realizado no âmbito do Mestrado em Educação Musical, Instituto de Estudos da Criança da Universidade do Minho, não publicado.